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Thursday, October 23, 2008

“O Dia Mastroianni” de João Paulo Cuenca (Agir)


João Paulo Cuenca é um jovem escritor carioca, nascido em 1978 que se estreou como romancista com a obra Corpo Presente, um livro fortemente elogiado pela crítica brasileira, acerca do qual Chico Buarque afirmava que «o Autor explora Copacabana e os seus personagens até ao limite».

João Paulo Cuenca participou, também, em várias antologias de contos e volumes de crónicas.
O Dia Mastroianni é o seu segundo romance. Trata-se do relato do quotidiano de dois jovens hedonistas, sem trabalho, que usufruem de uma desafogada situação financeira. Um deles ambiciona tornar-se um escritor de sucesso, porém, o fascínio pelo mundo das aparências – o mundo do cinema italiano dos anos 60, cuja figura emblemática seria a de Marcello Mastroianni, em filmes como La Dolce Vita – impedem-no de se envolver profundamente no processo da escrita, limitando-se a exibir uma erudição vazia, sem ligação à realidade, ao abester-se de estabelecer laços profundos com quem quer ou o que quer que seja. As personagens de Cuenca em O Dia Mastroianni representam um determinado grupo social, numa geração situada entre a classe média e alta, que vive apenas e só para o supérfluo.

Os protagonistas são dois jovens saudosistas e deslumbrados, cujo ideal de vida é o mundo do glamour do cinema italiano. Por isso as personagens adoptam um estilo de vida muito particular: ir a festas sem ser convidado, seduzir belas mulheres, comer bem - de preferência o prato mais caro da ementa no restaurante mais luxuoso da cidade, vestir ainda melhor e dormir em hotéis de cinco estrelas.

O objectivo é o de desenhar uma caricatura de um da camada jovem que já acabou os estudos académicos e não se conseguiu inserir no mercado de trabalho. É notória, no retrato traçado por Cuenca, a ausência de valores relativamente aos problemas da actualidade, demonstrados pelas personagens, como se estas vivessem num mundo artificial, isoladas do resto do mundo e protegidas pela redoma de vidro do luxo, do glamour e das aparências. Todas elas vivem numa espécie de embriaguez, atordoamento que as impede de pensar e ver o imenso vazio que é a vida de cada um.
A tudo isto, junte-se o facto de ambos os protagonistas serem consumidores regulares de haxixe e álcool, substâncias às quais recorrem para lhes facilitar o processo de evasão do real. Trata-se de uma característica emblemática de uma subcultura geracional que Cuenca coloca em evidência em O Dia Mastroianni. Estas personagens são estilizadas de forma a reunirem os clichés, os lugares comuns que constroem aquilo que Milan Kundera designa como o mundo do kitsch em A Insustentável leveza do ser. São figuras tipo, que evidenciam um pedantismo arrogante que se mescla com o cinismo daqueles que não se comprometem com causa alguma nem se dedicam a afectos profundos para perseguir o objectivo narcísico de fuga… aos lugares comuns e à banalidade! Ironicamente acabam por cair no ridículo, precisamente por tanto quererem evitá-los. São detentores de personalidades light que se expõem ao ridículo pela impúdica exibição do seu pretensiosismo. Sem terem algo por que lutar, um verdadeiro desafio a mobilizá-los, refugiam-se na evasão através da perseguição de um simulacro de prazer que já não são capazes de sentir sem o auxílio de substâncias psico-activas.
Todas as personagens masculinas estão precocemente envelhecidas, com a idade mental de Monsieur MXYZPTLK, o septuagenário impotente que apenas consegue reconstituir a representação do desejo erótico, quando assume o papel de voyeur num patético quadro de nostalgia...

A protagonista feminina – A Doce Maria - apesar de ter em comum a mesma superficialidade de Pedro Cassavas - o qual acumula a função de narrador - e Tomás Anselmo - o amigo "pendura", sexualmente bem sucedido - é a única personagem que trabalha na área que gosta e que é remunerada por isso. O trabalho assegura-lhe a independência necessária para não se ligar a ninguém em particular.

A autocrítica, expressa nos diálogos entre o narrador e um leitor, crítico e imaginário, todo-poderoso – característica sublinhada pelo facto de todas as suas falas aparecerem escritas em maiúsculas - o qual assume a função de juiz da obra, traz, simultaneamente, originalidade à narrativa, ao insuflar-lhe uma lufada de ar fresco, a qual salva a obra do rótulo de literatura light, mostrando até que ponto Cuenca se serve da ironia, do recurso à troça para evidenciar a profunda desilusão, face a uma geração cuja melancolia é uma doença crónica, que acaba por lhe minar a criatividade e o carácter. Uma geração cujo talento é desperdiçado pela ausência de sentido de compromisso.

A acção está dividida em capítulos que são assinalados por horas. Cada hora marca um momento significativo na via dos personagens de estilo Mastroianni.

Também os desenhos que antecedem cada capítulo, constituem símbolos de conteúdo onírico a sintetizar a mensagem de cada trecho da obra, reduzindo cada um destes mesmos capítulos à sua essência.

Aguardamos, com alguma ansiedade, por tudo o quanto já foi dito, por mais um romance de João Paulo Cuenca.


Cláudia de Sousa Dias

12 Comments:

Blogger Teresa said...

Não tenho vindo ao teu espaço e penitencio-me por isso, tanto mais que encontro sempre um prazer enorme na leitura dos teus textos. Obrigada por estares aí!!E Obrigada pela atenção que deste aos meus textos.

Não conheço este livro e, claro, fiquei com vontade de conhecer, culpa tua! Também estou com resmas de textos para fazer, pois os livros que me têm chegado são muitos e TODOS BONS! Estamos num grande e magnífico sarilho!

Beijo Grande
TSC

10:50 PM  
Blogger Claudia Sousa Dias said...

Obrigada,Teresa!

:-)

É um prazer enorme ter-te por cá e um prazer ainda maior falar contigo pessoalmente como já aconteceu na Onda Poética e no Clube Literário do Porto.

Também é verdade que, nas lides literárias, quem corre por gosto, como acontece connosco, não se cansa nunca!


CSd

11:31 AM  
Blogger Pedro said...

Não conhecia =) Não me fascina por aí além, mas gosto sempre de livros com personagens bem desenvolvidas...

1:02 AM  
Blogger Dalaila said...

essa tua capacidade de ler, e escrever é mesmo algo muitop especial.

beijinhos

1:15 PM  
Blogger Claudia Sousa Dias said...

é como os dfilmes dos anos 60 com Mastroiani...

CSd

12:36 PM  
Blogger Claudia Sousa Dias said...

Obrigada, Dalaila!

;-)


CSD

12:37 PM  
Anonymous Anonymous said...

Com vista a dar “voz” aos novos autores, o Portal Lisboa estabeleceu uma iniciativa única, no campo da criação literária portuguesa.

Neste sentido, o Portal Lisboa vai apadrinhar duas colectâneas literárias, uma de Poesia e outra de Contos Literários, a serem editadas pela Chiado Editora.

Gostava de ver os seus textos publicados por uma editora de prestígio? Tem aqui a sua oportunidade!

Descubra mais no site: www.portallisboa.net

6:21 PM  
Blogger Claudia Sousa Dias said...

é uma ideia...


CSD

12:45 PM  
Anonymous Anonymous said...

Italiano: Marcello MastroianNi. 2xN

Danilo

4:50 PM  
Blogger Claudia Sousa Dias said...

Obrigada Danilo. existe aqui uma tenência irresistível para aportuguesar um nome como este...

:-)


Já corrigi mas deveria ter verificado da mesma forma que fiz para com os textos relativos a Oscar Wilde - ao qual o computador coloca imediatamente um acento no O e no de Javier Marías ao qual o corrector automático lho retira...

De qualquer forma foi um lapso que passo desde já a corrigir.


:-)

Obrigada

6:51 PM  
Blogger Guilherme Montana said...

Esse livro é ótimo. Cuenca é um presente de excelência na nossa literatura.

6:11 PM  
Blogger Claudia Sousa Dias said...

pouca gente comenta este livro. eu achei chocante foi a superficialidade que caracteriza toda uma geração representada num dueto cujo ídolo é o símbolo da frivolidade.


csd

11:44 PM  

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