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Tuesday, September 25, 2012

“O Satyricon” de Petrónio (Europa-América/Cotovia)




Tradução de Jorge de Sampaio para Ed Europa-América

O Satyricon é uma obra de literatura latina cuja autoria é atribuída a um certo Caio Petrónio Arbiter, conselheiro de Nero, escrita por volta do ano 60 D.C., pouco antes do célebre incêndio de que falam as fontes históricas, como Suetónio (Os Doze Césares).
A narrativa de O Satyricon está a cargo do jovem patrício e boémio Encólpio, que fala de um conjunto de peripécias, na sua maior parte de teor extremamente cómico, que envolvem o seu amante Ascilto, assim como um escravo adolescente de deslumbrante beleza, Gíton. A eles junta-se também, mais tarde, o poeta Eumolpo. As aventuras vividas por estes quatro noctívagos pintam a decadência de costumes e valores na sociedade romana e enfatizam a postura cínica do pensamento dominante sobretudo quando este quarteto de foliões vai parar ao estabelecimento de Circe, mulher que se dedica ao comércio sexual. O cinismo desta personagem que se distancia do posicionamento do Autor, está patente na forma como simula conduzir o ritual de casamento – neste caso, de acasalamento – entre Gíton e Paniquis, duas crianças. O objectivo de Petrónio é exibir a desumanização relativamente aos valores da sociedade romana, recorrendo à sátira na sua forma mais crua. Neste caso, coloca em evidência a infância naquele meio social, patente na ironia virulenta com que o episódio é narrado. O equivalente à narração de Petrónio em termos de posicionamento e olhar, nos nossos dias seriam provavelmente os textos que servem de base ao programa televisivo Gato Fedorento, ou seja, a sátira sim, como indicia o título da obra, mas na forma mais elevada e refinada de escrita literária.

A classe mais visada pela pena ferina de Petrónio, é sem dúvida a dos cortesãos bajuladores que rodeiam o Imperador – Nero, filho de Agripina e trineto de Augusto - , sobretudo os libertos que conquistam a riqueza e posição social através da lisonja e da execução de trabalhos fora dos limites da licitude para o Imperador, bem como a classe dos cavaleiros que enriquecem à custa do comércio e pretendem atingir um estatuto idêntico ao dos patrícios (aristocratas, detentores dos mais elevados cargos públicos). O salientar do aspecto burlesco desta situação está mais evidente na descrição e na exaltação do exibicionismo grosseiro durante o banquete de Trimalchion. Trata-se de um episódio construído de forma a atingir directamente a figura tipo do novo rico romano, seja ele oriundo da categoria dos antigos escravos seja da classe dos cavaleiros e mercadores.

A pobreza em Satyricon

Vários autores têm vindo a mostrar interesse pela questão da pobreza em presente em O Satyricon, a forma como o problema afectava a sociedade romana e de como condicionava a relação com as províncias anexadas e geridas, depois, pelo império que a sobrecarregava com pesadíssimas taxas e impostos. Segundo o artigo da autoria do investigador Fábio Faversani, publicado na Revista Brasileira de história da Universidade de São Paulo, a questão da pobreza na obra de Petrónio passa pelo posicionamento dos agentes sociais nas relações de poder. Faversani dá a entender que a classe pobre de então viveria à mercê da boa vontade e do grau de generosidade dos ricos, concluindo que «...a plebe não poderia viver sem qualquer tipo de estratégia que lhe garantisse ao menos o sustento

Isto explica a ascensão dos libertos na corte de Nero. Mas leva também à discussão de dois conceitos implícitos na obra: a noção de classe (ou categoria social) e respectivo estatuto ou papel a ela associado. São dois conceitos essenciais para a podermos compreender do alcance da crítica relativamente à posição social de Trimalchion e dos que o rodeiam. Trimalchion é um homem que sofreu uma rápida ascensão social e que tenta imitar o estilo de vida de Nero.
O problema que se põe aqui é saber se este Trimalchion é o típico representante de uma classe que vem da categoria dos cavaleiros ou mercadores ou se se assemelha mais a um dos libertos do Imperador que enriqueceram rapidamente. No entender de Faversani, Trimalchion seria apenas uma caricatura, um estereótipo acerca de “como as élites viam os libertos ricos e não de como eles de fato poderiam ser. (Faversani, op. Cit.)” Logo, a figura de Trimalchion poderá apenas corresponder a um conjunto restrito de tipos sociais que se dividem em: comensais – na sua maioria, libertos – pessoas mencionadas pelos comensais (alusões) e servidores. Cada uma destas categorias converge directamente para a figura central de Trimalchion ( vértice da pirâmide social durante aquele evento), criando assim o seu quadro geral de relações de poder entre as classes sociais da Roma do século I, sendo precisamente estas relações de poder o factor que estrutura, ordena e conduz a sociedade romana. Ao focar-se nos cidadãos pobres mas livres da sociedade romana de O Satyricon, Faversani chama a atenção ara realidades sociais que são inquietantes mesmo na actualidade: a de que a pobreza “é um problema latente , não só para os que a observam de longe – sejam eles senadores romanos ou académicos e financeiros dos nossos dias – mas para os que nela vivem” (Faversani, idem), sobrevivendo ainda graças às mesmas atitudes para com o poder (subserviência, bajulação, tráfico de influências, prostituição física, moral ou intelectual).

Mas as opiniões acerca do Autor de O Satyricon vão divergindo, consoante os investigadores optando alguns por vezes, por uma leitura segundo mais literal. Segundo o tradutor e ensaísta Jorge de Sampaio (autor do prefácio da edição da Europa América) o estilo de Petrónio revela-se naquilo a que chama de “realismo corrupto”: «Com efeito, o autor passa em revista, com certa complacência, os vícios e anomalias sexuais da época. (Sampaio, Jorge de; in “O Satricon, prefácio desta edição)”
Para Pierre Athenaïse Larousse, as estórias, as reflexões, as imagens não são apenas imorais, mas quase sempre de uma obscenidade revoltante. Para este Autor, contudo, “Petrónio será sempre lido por quem quiser conhecer a fundo a Antiguidade”.

Exploração do conteúdo temático da obra

Na intenção de facultar uma corrosiva exposição a um público leitor e culto numa sociedade que começa a apodrecer nas suas estruturas, o Autor ocupa-se em revelar alguns mecanismos que fazem imperar a lei do mais forte, e dos que gozam de relações sólidas com o poder, sob uma aparente capa de frivolidade patente nas atitudes exteriores dos protagonistas. Esta frivolidade é contrariada por inúmeras passagens do texto em que as personagens – sobretudo Encólpio e Eumolpo – assumem uma postura de reflexão crítica:

«Que podem as leis, onde o dinheiro é o único senhor e onde a pobreza não pode ter razão? Mesmo os que, na vida, seguem carregados com a escola cínica, mais do que uma vez vendem por bons denarii a verdade. A justiça não passa de uma mercadoria pública e o cavaleiro que julga a causa limita-se a aprovar o mercado.»

Na mesma secção do texto são aludidas também, de forma velada, as arbitrárias expropriações ordenadas pelo imperador, visando heranças avultadas e objectos pessoais de grande valor que passam directamente para a sua fortuna pessoal e não para o erário público, do qual dispõe mesmo assim, como se lhe pertencesse.

À medida que avançamos na leitura, vamo-nos apercebendo de várias lacunas no texto, que há vários fragmentos que se perderam ou foram corrompidos, mas o fio condutor, apesar de tudo, não se perde.

No quadro ilustrativo da polémica ceia de Trimalchion, Encólpio mostra-se atónito perante o exibicionismo vulgar do ex-escravo, que tenta imitar a aristocracia. Encólpio ocupa-se, durante todo o capítulo, em ridicularizar a extravagância, o exagero, a ostentação.

Outro grupo fortemente visado pela ironia de Encólpio são os astrólogos e adivinhos, cujos oráculos sempre tiveram grande influência nas decisões imperiais, e que exprime na parábola da terra e do favo de mel.

O desalento esta patente na secção 44 numa interrogação retórica:

«Que se pode esperar se nem os deuses nem os homens têm dó da nossa Cidade?
(…)
Já ninguém acredita que o céu seja o céu (…) ninguém dá um prego a Júpiter, mas toda a gente conta de olhos fechados os seus tostões».

Numa palavra o dinheiro não circula e com o medo crescente que este se esgote, recorre-se então ao entesouramento, crescendo também a mesquinhez e a avareza.
Petrónio não deixa de chamar a atenção, pela voz de Encólpiom para a precariedade, sempre em tom irónico, em que vivem os intelectuais e artistas em Roma:

«...os intelectuais são mal-vistos pelos ricos. É mais considerado um cabeleireiro ou um latoeiro ou, mesmo, um advogado!».

Nesta época da história, a mentalidade comercial de um advogado é colocada ao mesmo nível da que qualquer comerciante vulgar. É o mercadejar da Justiça que se deixa manipular pelo poder e pelo dinheiro. No seguimento, é também abordada a questão da fuga aos impostos e da sorte dos mais desfavorecidos, os quais andam como saltimbancos atrás de um patrono, rico e poderoso, dependendo a sua sobrevivência da sorte mas também da protecção e da benesse dos mais ricos.

O narrador continua a sua observação e crítica social, sempre com exacerbada veia satírica, aplicando-a à classificação das profissões, no que aproveita para chamar a atenção para a terror supersticioso dos romanos, de que se aproveitam alguns inteligentes oportunistas.

Prossegue ainda a descrição estilizada dos apetites, que se traduzem muitas vezes em festins pantagruélicos. Um dos momentos mais hilariantes da trama consiste no final da festa de excessos dada por Trimalchion, de cuja casa os protagonistas tentam escapar-se, após assistirem a uma violenta rixa entre o anfitrião e a mulher, mas esta casa é de tal forma e ridiculamente descomunal que os amigos perdem-se nos corredores. À semelhança do Imperador, Trimalchion manipula o “domus” como se fosse a corte.

Nero continua a ser visado ainda durante aquele jantar, que termina em orgia, com a alusão aos maus declamadores, artistas medíocres e não profissionais, imitadores de saltimbancos, chamando indirectamente a atenção para o comportamento narcisista de um imperador que se torna ridículo na sua insistência no que é comunmente visto – mas jamais dito – como uma tentativa patética de eclipsar poetas, declamadores e actores profissionais.



A decadência expressa na atitude dos convivas e sobretudo na do anfitrião é representativa dos valores e da ética – ou falta dela – que dominam a sociedade romana naquele período. O desregramento social e o crescimento da anomia no tocante às relações sociais, éticas e jurídicas indicia a inexorável derrocada de uma civilização onde passou a dominar o pensamento de que “o amor do talento nunca enriqueceu ninguém” e de que:

«Se inimigo de todos os vícios, alguém decide seguir na vida o caminho recto, começa por ser detestado (…) gostaria de que o inimigo a quem devo esta confidência (Nero) fosse bastante virtuoso para se deixar comover. Mas é um malfeitor endurecido..».

A chamada de atenção para a hipocrisia e falso moralismo onde o dinheiro corrompe a virtude, destruindo até a inocência, encontra-se patente na forma como Eumolpo descreve a sedução de um jovem de quem foi preceptor. A amoralidade das personagens presente no discurso é aqui utilizada, mais uma vez, como recurso de estilo, em género de caricatura, utilizada por Petrónio para melhor ilustrar um quadro de sátira aos costumes (mores) e à moralidade (moralitas) da sua época.
O mesmo faz e relação às artes ou ao conceito de arte dominante. A obra caracteriza-se por uma crítica violenta ao paradigma dominante, uma vez que a Arte deixou de ser o resultado de uma reflexão ou do pensamento para passar a ser o reflexo do estilo de vida ideal dos novos-ricos.
A demarcação do posicionamento do Autor da obra, é projectada na voz de Encólpio, patente na frase:
«E nós, mergulhados no vinho e no deboche, nem sequer temos força para estudar as artes existentes...»
(…)

«Todos os homens acham que uma barra de ouro é mais bela do que todas as obras de Apolo ou Fídias...»

No seguimento desta linha de raciocínio, Encólpio prossegue a reflexão, ao falar da perseguição aos poetas ao aludir, de forma dissimulada, ao facto de o Imperador tentar eliminar os seus concorrentes mais directos na arte de compor e declamar poesia, não podendo admitir a ideia de alguém ocupar a posição central naquele domínio que não ele próprio.

Seguem-se mais peripécias envolvendo rixas e situações burlescas representadas por várias figuras tipo da sociedade romana – como a Viúva Inconsolável. O envolvimento de Gíton com a viúva de quem fora antes escravo, provoca ciúmes em Encólpio, que se esmera em cínica verborreia visando desconsolada senhora. Disfarça a situação encobrindo Gíton, facilitando-lhe a fuga . A farsa ameaça desmoronar-se mas a sorte acaba por favorecê-la: o barco onde viaja a viúva naufraga e o poeta Eumolpo dá vozz à tragédia sob a forma escrita. A morte de Lichas, outro dos perseguidores de Gíton, que foi também seu antigo proprietário, prova que a opulência não salva ninguém do próprio destino.

O tema a explorar a seguir é a morte, discutindo-se os vários tipos de morte esperada.

Com o desembarque em Crotona, os quatro protagonistas questionam até que ponto há margem para que um cidadão possa enriquecer honestamente sem recorrer à mentira e ao embuste, à dissimulação e à bajulação.

Nessa cidade, as letras não ocupam posição de relevo, a eloquência não tem lugar, a simplicidade da vida e os costumes puros não são louvados nem recompensados, mas sabei que todos os homens que encontrareis na cidade se dividem em duas categorias: os caçados e os caçadores. Nessa cidade ninguém cria crianças, porque quem tiver herdeiros naturais não é convidado para os jantares e os espectáculos, é excluído de todos os prazeres, fica obscuramente entre os infames.

(…)

Ides penetrar numa cidade que se assemelha a um campo assolado pela peste: só encontrareis cadáveres a serem devorados e que os devoram...» .

Trata-se evidentemente de uma alegoria que representa a cidade de Roma e o assédio que exerce o Imperador às famílias cujos bens cobiça.

Entre a questão social, a justiça, as normas e comportamentos, a questão artística, a forma de produzir arte e a ética oscila a orientação da escrita e do pensamento, de Petrónio, vertido na narrativa de Encólpio. O evidente repúdio à então forma dominante de fazer poesia que assassina a arte, produz um tipo literatura grosseira e primária, uma poesia pobre “contando as silabas, como quem dispõe tijolos para erguer as paredes de um prédio”.

«Mas um espírito bem formado, não aprecia ouropéis e o espírito não pode conceber nem dar nada à luz sem ter sido impregnado pela vaga imensa da literatura.
(…)
é preciso atender a que formas felizes não entrem em choque com o corpo da obra, mas que brilhem em harmonia com o tecido em que se inserem.»

E referindo-se indirectamente ao imperador:

«Já todo o mundo pertencia ao Romano vitorioso, todo o mar, toda a terra e toda a órbita de um ao outro lado e ainda não estava saciado».

Não deixa de ser um intrigante contraste o requinte da prosa poética, contida nos parágrafos de conteúdo reflexivo, e os contornos grotescos com que é exposta a acção das personagens, sempre que fundidas no conjunto da mole humana ou em confronto com aqueles a quem Encólpio e Eumolpo classificam de arrivistas. Os textos reflexivos são ricos em significações, imagens evocativas, associações de elementos sensoriais eivados de uma ironia ácida, particularmente incisiva na forma de fazer política. Chega-se inclusive a fazer a evocação da deusa Fortuna, apelando à sua intervenção na erradicação da tirania. O impulso revolucionário manifesta-se, assim, apenas em privado, ou numa sob a forma de narrativa e, mesmo assim, camuflado nas entrelinhas, velado, já que não existe a menor margem de manobra para ser expresso publica e explicitamente no momento em que é escrito O Satyricon, a não ser sob a forma de alegoria ou parábola, prevenindo a possibilidade de o Autor cair na apertada malha de intrigas da corte e dos esbirros de Nero. É por isso que assistimos na narrativa de Encólpio à exortação à guerra civil numa cidade algures no Império Romano, mas feita por personagens de conduta duvidosa e de imagem pública mais do que desgastada, logo sem credibilidade. É sobretudo por esta razão que as personagens não assumem a postura de herói tradicional, de paradigma susceptível de ser imitado, mas antes a atitude exterior de seres vulgares, praticamente no limiar da exclusão da hipocritamente “boa sociedade”, perdulários. Ou seja, a imagem oposta do tradicional modelo de virtudes do pater famílias romano. Só com o perfil de pessoas que não são dignas se serem imitadas porque retratadas como devassas ou perversas se poderia, então, expor de forma tão ousada os vícios das elites corruptas.
Assim, Petrónio coloca muitas vezes Encólpio a narrar uma história, uma parábola que lhe foi contada por Eumolpo, passada numa época anterior. Petrónio joga com a dança das horas, na Roda da Fortuna, a alegoria da Boa-fé e da Justiça, esta última apresentada com os cabelos em desalinho e a Concórdia, de luto, rasgando a túnica. No reino das trevas, o Reino de Plutão, deus dos Infernos, canta o coro das Erínias, as Fúrias, acompanhadas por Éris, a Discórdia.

Por último, Encólpio é submetido à humilhação de um último fracasso num templo consagrado ao que parece ser um santuário a Príapo, o deus da virilidade masculina, após falhar a missão de ter relações sexuais com uma das mais belas cortesãs do Império.
É açoitado, submetido a tratamentos violentos, sem sucesso. Não consegue pagar por sexo, mesmo com a mais sublime das criaturas e é escarnecido pelo facto. O mau “desempenho” de um jovem como Encólpio num lugar daqueles, é de tal forma socialmente mal-visto que o torna alvo das mais requintadamente sádicas humilhações. É obrigado a humilhar-se e a submeter-se a um sinistro ritual dirigido por uma sacerdotisa de deuses infernais, evocando, além de Príapo, a misteriosa Hécate. O livro termina com uma lacuna, mais um fragmento que se perdeu mas a dar a entender ser o destino do intelectual e do virtuoso fracassar, ao contrário do medíocre, mergulhado no deboche do estilo de vida dominante, a que se submete para sobreviver sem ser perseguido.

O Satyricon” de Fellini

O filme de Federico Fellini, baseado na obra de Petrónio, é uma verdadeira obra-prima da sétima arte e uma pérola do cinema clássico italiano. Para além de ter realizado uma notável adaptação de um clássico latino ao cinema e tem o mérito da impecável mestria com que ultrapassa uma possível dificuldade inicial, dado que a obra literária chegou até nós incompleta. Fellini ultrapassa com notável habilidade o problema da manutenção de um fio condutor , ao elaborar quadros cénicos, como se fossem situações independentes, facetas da mesma realidade social, diversas faces do mesmo prisma.
Fellini é fortemente influenciado pelas obras do psicanalista Carl Jung, facto que é notório durante a rodagem deste filme, sobretudo no tocante à teoria da “anima” e do “animus” (os arquétipos masculino e feminino na alma humana independentemente do sexo). Esta ideia e a teoria do inconsciente colectivo foram amplamente explorados em O Satyricon.

O Satyricon de Fellini tem ainda o mérito de exibir uma cuidada reconstrução da época em termos de cenários, guarda-roupa, assim como trechos onde são declamadas obras clássicas gregas e latinas na língua original, como acontece durante os espectáculos que acompanham o banquete de Trimalchion.

Por todas estas razões, o filme de Fellini e a sátira/alegoria de costumes de Petrónio constituem duas obras de notável talento que se complementam e iluminam mutuamente.


Cláudia de Sousa Dias
18.11.2011- 17.09.2012

Outros trabalhos interessantes sobre a obra:




6 Comments:

Blogger P said...

Bom texto, Cláudia!

12:22 PM  
Blogger Claudia Sousa Dias said...

E o Baudolino o primeiríssimo a comentá-lo!

5:14 PM  
Blogger P said...

Estou a ler 'O mendigo' de F. Pessoa. Vamos ver a impressão que causa.
bj

4:25 PM  
Blogger M. said...

Que bom, Cláudia!!! Anseio por oportunidade para o ler, espero que ainda este ano ou no início do próximo!
"Se inimigo de todos os vícios, alguém decide seguir na vida o caminho recto, começa por ser detestado (…)" - continua actual...
Beijoquinhas,
Madalena

12:02 AM  
Blogger Claudia Sousa Dias said...

;-)

12:19 AM  
Blogger Unknown said...

a capa amarela é tradução de Delfim Leão.

11:50 PM  

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